
Biografia
Biografia de Cruz e Sousa
João da Cruz era filho de escravos na Ilha do Desterro (atual Florianópolis); o próprio poeta, nascer, sustentava a condição de escravo. sobrenome Sousa foi herdado do proprietário de seus pais, que alforriou toda a família após a Guerra do Paraguai. Sua vida pessoal foi muito trágica: casou-se com Gavita, que também fora escrava; o casal teve quatro filhos, todos falecidos prematuramente. Gavita enlouqueceu e passou um longo tempo internada. Por seus escritos abolicionistas, Cruz Sousa sofreu perseguições. O poeta, tuberculoso, morreu aos 37 anos, absolutamente abandonado.


Sua obra apresenta uma evolução importante, uma vez que abandona o subjetivismo e a angústia iniciais em nome de posições mais universalizantes. De fato, sua produção inicial fala da dor e do sofrimento do homem negro (evidentes colocações pessoais), mas evolui para o sofrimento e a angústia de todo ser humano.
A primeira estrofe do poema Primeira Comunhão é marcada por uma descrição inicial metonimica grinaldas e véus; a parte pelo todo), que nos leva a uma metáfora (moças = Flores). Observe que os poucos substantivos (grinaldas, véus, Flores, Sentimento), modificados por vários adjetivos (brancas, níveas [de neve], purificadores, carnais, alvas, delicado, leve), revelam a busca do Ideal. adjetivação será constante ao longo do poema.
O soneto trabalha com uma surpreendente superposição de image:: à imagem de adolescentes cobertas de grinaldas e véus brancos no para a primeira comunhão se superpõe a imagem dessas mesmas moças mesmo altar para o casamento. Uma parábola, portanto. Wolfgang Kayse: em Análise e interpretação da obra literária, define parábola da seguinte forma: "os elementos de uma ação, exposta ao leitor, se referem, ao mesmo tempo, a uma outra série de objetos e processos".
Cruz e Sousa é sem dúvida a figura mais importante do nosso Simbolismo, chegando-se a afirmar que sem ele nem teríamos essa estética em nossas letras. Como poeta, teve apenas um volume publicado em vida: Broquéis. Os dois outros volumes de poesias são póstumos, indício de uma produção intensa que poderia ter sido mais bem trabalhada, apesar de o poeta ser considerado um dos maiores nomes do Simbolismo universal.
A poesia de Cruz e Sousa mantém a estrutura formal típica do Parnasianismo (uso de sonetos, rimas ricas, etc.), mas em um tom mais musical, rítmico, com uma variedade de efeitos sonoros, uma riqueza de vocabulários, e um precioso jogo de correspondências (sinestesias) e contrastes (antíteses). Transparece a preocupação social, onde a dor do homem negro (fruto de suas próprias experiências de preconceito) funde-se à dor universal humana, conferindo à sua obra um tom filosófico que reflete a angústia, o pessimismo e o tédio. A solução é sempre a fuga, a preferência pelo místico, a busca pelo mundo espiritual que o consola. É o eterno conflito entre o real e o irreal dentro do universo humano, os mistérios de Deus e do homem, da vida e da morte que convivem com o amor, o misticismo, e os desejos. O resultado é sempre o sofrimento do ser, muitas vezes personificado pela dor do preconceito (o que leva aos ideais abolicionistas dentro de sua obra). Em contraste com a cor negra, está o uso de um vasto vocabulário relacionado à cor branca: neve, espuma, pérola, nuvem, brilhante, etc. Isso reflete sua obsessão, tipicamente simbolista, pela imprecisão, pelo vago, a pureza e o mistério.
Sua obra ainda é vastamente tomada pela sensualidade, pela busca da auto-afirmação e pela subjetividade (indicada no uso constante da primeira pessoa), pelo culto à noite, pela busca do símbolo e do mistério da existência, através de uma imagem obscura, sugerida e distorcida. É considerado por muitos como um dos maiores poetas simbolistas do mundo, com uma qualidade literária muito próxima a dos melhores poetas simbolistas franceses, como Mallarmé.
Está sempre presente a sublimação, a anulação da matéria para a liberação da espiritualidade, só conseguida na sua totalidade através da morte. Ao lado disso, percebe-se o uso de maiúsculas valorizando as ideias (no sentido platônico), e uma angústia sexual profunda, como bem atesta o soneto "Primeira comunhão":

Além da sexualidade, tema presente na obra de Cruz e Souza, esse son.y: remete a algumas outras características suas, como a obsessão pela cor ca e por tudo aquilo que sugere brancura: "véus brancos", "véus de neve "alvas Flores", "luar", "virginais brancores", "luzes claras", "níveas hóstia "alvadias". Repare que a linguagem dos simbolistas, com seus apelos se:-_- soriais, seus símbolos e jogos de vogais, não se assemelha à de nenh= outra estética. A musicalidade e as frequentes aliterações são outra ma::E da poesia daquele que já foi chamado de Cisne Negro ou mesmo de Negro. Como exemplo, uma famosa estrofe do poema "Violões que chorar:
Note como a repetição do fonema /vv e sua combinação com as vogais (va,ve,vi,vo,vu) nos sugere o dedilhar melancólico de um violão.
